Levantamento de peso paralímpico promove bem-estar a praticantes

"Foi a oportunidade de conseguir uma vida que qualquer outra pessoa pode, deve e merece ter", comenta paratleta

Levantamento de peso deve ser orientado por Profissional de Educação Física - Comunicação - CONFEF

 

Por Juliana Reche Swerts

“O esporte nos mostra que somos capazes de ir além”. Pela percepção da paratleta Camila Feitosa, esses são alguns dos principais ganhos que ele e os demais 25 alunos e atletas do projeto de extensão da Universidade Federal de Sergipe (UFS) têm vivenciado desde 2017, quando começaram as aulas de halterofilismo — levantamento de peso — paralímpico, sob coordenação do Prof. Felipe José Aidar Martins [CREF 003827-G/SE]. Hoje a equipe já é destaque em nível nacional, com atletas integrando a seleção brasileira na modalidade. Mas nada disso seria possível sem o olhar atencioso do professor responsável Márcio Getirana Mota [CREF 002498-G/SE]. Ambos são profissionais de Educação Física, devidamente registrados no Conselho Regional (CREF) e, por isso, habilitados para a atuação segura. Márcio mantém o foco não apenas naqueles que competem, mas também na socialização e integração entre a comunidade.

Para ele, trata-se de algo muito além da competição. “Não queremos apenas formar atletas. O foco é cuidar das pessoas e, consequentemente, colocar em prática o que aprendemos em nossa grade curricular, mantendo a saúde em primeiro lugar. A gente pensa sempre na autonomia funcional de cada um, equilibrando a saúde e o desenvolvimento no esporte, que estão correlacionados, valorizando a pessoa e fazendo com que ela se sinta útil. É uma transformação para elas, mas também para nós. Até eu, mesmo já sendo Profissional de Educação Física há anos, aprendi muito depois de lidar com esses atletas”.

Para Márcio, a limitação está no campo das ideias, não necessariamente, tratando-se de uma realidade. “Nós acreditamos, erroneamente, que pelo fato de a pessoa ter alguma deficiência física ou intelectual, ela não é capaz de realizar determinada situação. Aqui, comprovamos o oposto, por meio do exemplo. Pensando em nossos atletas que competem a nível de seleção, sejam os cadeirantes ou os que utilizam muletas, nosso treino não pode ser apenas voltado à modalidade em questão. Precisamos levar em consideração, também, a saúde deles para que não se lesionem em nenhuma parte do corpo”, explica o professor.

Por se tratar de pessoas com algum tipo de deficiência, todo o processo de adaptação deles conta com anamneses específicas, em que os profissionais estudam a lesão de cada um. A partir disso, os movimentos e estímulos levam em consideração a condição física e o nível de cada atleta. Importante, porém, dizer que, apesar de os alunos terem suas limitações, todos os treinos são ajustáveis para que possam, cada um à sua maneira, treinar de forma eficiente e dentro de seus limites.

Em 2019, pouco mais de um ano após ter começado os treinos, a atleta Camila Feitosa foi eleita a segunda mulher mais forte do mundo, na época levantando 53kg no supino, sendo que ela pesava 21,8kg. No ano passado, superou a marca de 63kg. Ela, que também é aluna da universidade, no curso de Artes Visuais, conta que sua vida melhorou totalmente depois da atividade física: “Por meio do esporte, eu aprendi e me apaixonei pela competição e pelo paradesporto, sem contar que isso ampliou imensamente os meus horizontes. Eu passei a viajar para outras cidades, já antes eu não tinha oportunidade, tanto pela condição financeira, quanto pelas limitações físicas. O esporte me abriu esse leque, tanto de oportunidades, de possibilidades e de conhecer novas pessoas, as quais servem de espelho para mim. Isso contribuiu totalmente para a construção de quem sou hoje”.

Sabe-se que a atividade física em si, desde que orientada por profissional de Educação Física devidamente registrado no CREF, já é transformadora. Agora, pensando em pessoas que têm algum nível de deficiência, a transformação é ainda mais acentuada. A cada evolução, que pode parecer pequena, os alunos se sentem mais confiantes ao perceber que, apesar de algumas adaptações, as limitações ficam cada vez menores. Esse processo é percebido no levantamento de peso, no ciclismo, na corrida... Ou seja, independentemente da modalidade, a atividade física por si só é capaz de transformar as pessoas pelo simples fato da socialização, que infelizmente ainda é restrita, nesse grupo.

No esporte, todo mundo se comunica e socializa. Essa é a engrenagem principal para que essas pessoas se sintam motivadas a se cuidar e terem mais propósito de vida, inclusive para investirem na formação de nível superior. Realidade essa que vem mudando entre os alunos do projeto de extensão que, com as oportunidades abertas pelo sistema de cotas, estão ocupando cada vez mais os assentos dos diferentes cursos de graduação da UFS. Desta forma, eles podem se inserir cada vez mais não só no mercado de trabalho, mas nos demais setores da sociedade.

O projeto de extensão é aberto tanto para estudantes da UFS, quanto para as pessoas da comunidade que queiram treinar. Seja para levantar peso ou para realizar estágio, o projeto está de portas abertas. Além dos graduandos da UFS, alunos de outras instituições têm a oportunidade de cumprir seus estágios obrigatórios na instituição, como é o caso da aluna de Educação Física da Universidade Maurício de Nassau, Thamirys de Melo. “O estágio é de extrema importância, porque ele nos possibilita colocar em prática tudo o que vemos na teoria na faculdade. Nós alunos costumamos ficar ansiosos, querendo ver como os conceitos são aplicados em campo. Esse é o momento em que podemos errar e aprender, ou seja, a preparação para ingressarmos no mercado de trabalho, prontos para atuar na área”, comenta.

Ela divide, também, como tem sido a sua experiência auxiliando os treinos: “Eu cheguei aqui um pouco insegura, para ajudar nas aulas desses alunos. Com eles, eu passei a ter uma perspectiva do mundo diferente, não só no aspecto profissional, quanto no humano, principalmente por conseguir me colocar no lugar do outro. Eu pretendo seguir na área escolar e trabalharcom esse público (atletas paralímpicos) em específi co. Minha intenção é contribuir para que se perca a ideia de que um aluno com defi ciência é um fardo, como se ele fosse atrapalhar a aula. Precisamos é buscar inclusão, com olhar específico sobre cada um. Meu objetivo é oferecer uma aula personalizada para incluir e acolher”.

Apesar de ainda ser um projeto relativamente recente na instituição, além dos dois anos durante a pandemia em que as aulas foram suspensas, a importância das atividades é bem consolidada pela reitoria. Sempre que necessário, a instituição oferece transporte para as competições que acontecem fora do estado. Eles podem contar ainda com constantes melhorias na estrutura da academia, que está em fase de transição para um novo espaço, no centro de vivências, com características mais específi cas, que atendem melhor as demandas dos atletas.

“É gratificante perceber o quanto a gente melhorou em termos de materiais, de 2017 até agora. Isso tudo graças às pessoas que estão à frente da administração da universidade, que entendem a real importância em ter esse processo de extensão em andamento aqui na instituição. É importante dizer que nós temos o apoio não só do departamento de Educação Física, como de toda instituição, proporcionando assim uma constante troca e evolução entre todos nós”, comenta o professor Marcio.

Camila Feitosa Oliveira finaliza: “parece um pouco clichê, mas o esporte realmente salva, cura, transforma e liberta. Ele expande os nossos horizontes, nos proporciona uma visão além do nosso mundinho que, para nós que temos algum tipo de limitação física, acaba sendo muito restrito e fechado, a começar pela falta de oportunidade, perspectiva de vida e crescimento financeiro. Para mim foi a oportunidade de conseguir uma vida que qualquer outra pessoa pode, deve e merece ter”.

Produção de Ciência - O projeto de extensão tem 27 dos 30 artigos acadêmicos voltados para a modalidade paralímpica publicados na base de dados PubMed. O Grupo de Estudo e Pesquisa do Paradesporto Saúde e Performance tem pesquisas que envolvem não apenas o controle bioquímico, mas técnicas de execução de supinos, de forma biomecânica.

Sobre o professor - Márcio Getirana Mota é professor mestre em Educação Física, árbitro a nível nacional de halterofilismo paralímpico. Na UFS, faz parte da equipe Clube Condição Futuro, um também projeto de extensão da instituição. Dentro do quadro, atua como técnico da modalidade.

 

* Com informações da Confef

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